Aclimate-se ou sofra as consequências

Como todos já sabem, é o que faz a diferença, testei, comprovei, e quase não voltei e junto tinha um amigo.

Junho de 2003 saímos de São Paulo direto a La Paz, Huayna Potosi foi a montanha escolhida.
Chegamos em La Paz à tarde, no mesmo dia fizemos os preparativos e no dia seguinte as 16 hs ja estávamos a 5.200m no campo roca.

Para explicar melhor, saímos de Santa Cruz que esta a 400 metros do nível do mar e fomos para La Paz a 3.600m, no dia seguinte estávamos a 5.200 metros no Campo Roca.
Adivinha o que aconteceu? 

Muito mal estar, tontura, enjôo, falta de ar, tosse, dor de cabeça, ou melhor, prestes a ter um edema.

À 1 hora da manhã hora prevista para sair, César não pode sair da barraca para escalar e eu não sabia, se ia ou não ia, entre uma vontade de vomitar e outra resolvi ir, escalei como uma tartaruga atordoada, cheguei até 5.700m depois de algumas poucas horas.

Eu e meu parceiro de cordada Juan, um chileno que estava vivendo em La Paz a 3 meses.
Falei para ele que era melhor eu voltar, tinha força (ou achava que tinha) para chegar ao cume, mas não teria forças para voltar de lá, ficamos um pouco parado na primeira Pala, (primeira passagem técnica) sentado num pequeno plato de gelo de costas para uma grande greta de uma coloração de azul incrível, falei se ele quisesse seguir sem mim para seguir que eu voltaria dali.


E assim foi, eram às 5:00 am, fiquei no meio da primeira Pala, uma parede de mais ou menos 50º de inclinação, pensando se descia ou esperava começar a clarear.
Resolvi começar a descer, mas eu estava muito atordoado, tinha muito sono e por esse tempo que fiquei parado ali, minhas forças se esvaíram e não tinha quase mais forças para nada.
Quando ia começar a descer meu head lamp apagou, tinha que trocar de pilhas, tirei minhas luvas, mas até pegar as pilha e abrir o compartimento para colocar-las já não sentia meus dedos e não sentia os pólos da pilha na escuridão daquela noite sem luar.


Não conseguia colocar-las certo pois não via praticamente nada. Depois de minutos tentando e meu raciocínio muito lento, lembrei de pegar a máquina fotográfica, antes de bater a foto, à câmera acende uma luz que é para focar, usei esta luz para acertar a posição das pilhas, assim pude começar a descer.

Resumindo, no meio da descida que tinha de desnível 500 metros verticais até o campo alto, dormi e acordei diversas vezes, parava, me jogava no chão e dormia por algum tempo, nas decidas de paredes mais íngremes enfiava os piolets com o resto da força que me sobrava e dormia e sempre dispertava com uma voz dizendo: Tem que descer, levanta, tem que descer....

Então amanheceu, e comecei a ver o acampamento, estava a uns 300 metros de distancia de mim, mais pareciam 3 km, já não podia quase andar, dava 5 passos de meio pé de distância e sentava, torcendo para alguém do acampamento sair da barraca e me ver, assim poderia me ajudar.

Onde se podia escorregar eu tentava escorregar de bunda, às vezes pegava um pouco de velocidade, então freava com um dos piolets, e ficava com o braço esticado e todo corpo sem ter força para me puxar e retirar a piqueta.

E assim cheguei no acampamento, larguei todo equipo na porta da barraca, acho que não tirei nem as botas, isso já era mais ou menos 7:30 am. lembro do meu amigo perguntado: "Chegou"? e eu mal respondi que não.

Sempre escutava sobre o Soroche, o mal da montanha, mas nunca tinha sentido alem de uma leve dor de cabeça e queria ter e sentir uma experiência desta, para ver realmente como era. Assim entenderia melhor e poderia montar um bom plano de aclimatação, queria ver por mim mesmo, já tinha lido e escutado de como seria e sabia que talvez tivesse problemas, mas sentir na pele é outra coisa.

Lá percebi que quando se morre na montanha por cansaço, não deve ser ruim, deve ser sem dor, é um estado que em 10 segundo você esta dormindo e sonhando, e de repente você acorda e escuta, tem que descer, tem que descer e ao mesmo tempo uma outra voz fala, descansa mais um pouco e quando vai ver, esta acordando outra vez, é muito insano.

Como experiência valeu, mas nunca mais quero passar por isso.

Em uma das muitas paradas para descansar, logo após o amanhecer, chegando no acampamento alto.

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